Sou avesso à ideia de ir ao Paraguai para fazer compras. Como tinha de tomar voo em Foz do Iguaçu – ainda não comentei hoje, mas o aeroporto de Cascavel, minha cidade, é impraticável e só vira assunto em época de campanha política –, acabei aceitando o convite da Juli. Saímos de casa umas horas mais cedo e cruzamos a ponte.
Antes de mais, é preciso que se observe: dizer “fui ao Paraguai” é puro eufemismo. O Paraguai que eu conheço, e que a maioria conhece, é só aquele imenso camelódromo que vende de tudo em Cidade do Leste, o primeiro referencial depois da Ponte da Amizade, e que confere algum sentido ao apelido “paraguaizinho” que se dá a qualquer sequência de bancas geminadas de camelôs. Nunca avancei mais, para conhecer o país, sua difícil realidade, o povo que historicamente tenta se desvecilhar de uma imagem marginalizada.
Enfim, fui ao Paraguai. Sou daqueles caras que terão dois garfos na mão no dia em que chover sopa. Então, nada mais inerente a mim que uma chuva dos diabos enquanto andava por aquelas ruas com a esposa e a sogra. Estive lá com um propósito único, o de comprar um violão novo – que comprei, um Ibanez, por 350 dólares. Mas a peregrinação da Juli e da dona Judith por roupas para revenda acabou me castigando um pouco. Segundo elas, dei sorte, porque a chuva teria espantado as mulheres de voz aguda que costumam perseguir os incautos visitantes gritando "meia, meia". Vão muito ao Paraguai, a Juli e a mãe dela.
Já que lá estava, lá torrei alguns dinheiros. Como numa camisa do Corinthians, aquela preta com detalhes dourados, à qual despendi 15 reais. O vendedor me garantiu ser legítima. Como também são legítimos, garantia dada por outro ambulante, os óculos escuros da HB, pelos quais paguei 10 pratas. Ótimas compras, as minhas. No violão, que é mesmo muito bom, não consegui desconto, mas o vendedor me deu um estojo razoável para guardá-lo, além da alça. E trouxe no bolso, inadvertidamente, a palheta que me foi emprestada pelo moço para testar o instrumento. Ah, comprei também um par de tênis e outro de meias, já que saí de lá com os pés encharcados por volta do meio-dia e só chegaria ao meu destino no final da noite. Vim de tênis novos, que custaram 40 reais e são bem confortáveis.
A culinária assusta. Em várias das ruelas, os cheiros das comidas preparadas ali mesmo, nas ruelas, misturam-se e tornam o ambiente impraticável. Fiquei impressionado com a voracidade com que alguns jovens devoravam algo qualquer, umas frituras às quais não tive coragem de olhar diretamente. Tinha também o tio de barriga de fora que preparava chawarmas debaixo de uma goteira, e cachorros-quentes mais duvidosos que a boa fase do Fluminense no Brasileirão. Num dos miniambientes, uma menina de não mais que sete anos preparava algo parecido com tapioca. Um panorama de tirar o apetite de qualquer um.
Visitei as duas casas de câmbio que encontrei em Cidade do Leste. Como estava vindo para a Argentina, decidi comprar pesos. Nenhuma das duas vendia pesos, apenas compravam-nos. Estranho. Minha má impressão quanto a isso foi quase zerada quando percebi, horas depois, já no aeroporto de Foz, que lá também não se vendiam pesos. Fui comprá-los em Guarulhos – besta que sou, acabei me sujeitando ao trajeto Foz-Guarulhos-Buenos Aires, que na viagem de volta, domingo, será convertido em Buenos Aires-Rio de Janeiro-Foz. Se quisesse comprar dólares no Paraguai, bastaria visitar uma dessas lojinhas de R$ 1,99. Piada besta, mas a cotação que eles praticam é mesmo causticante.
Desprevenido, vi-me sem cigarros enquanto Juli e dona Judith procuravam numa galeria qualquer o dinossaurinho que o Luc Jr. pediu de presente - e ele disse que queria um de brinquedo, não de verdade, ainda bem. Na banquinha de refrigerantes, achei um Marlboro Light. Comprei-o, e só depois de acender um é que fui notar, alertado pelo péssimo sabor, a inscrição "Fumar daña la salud" na lateral da embalagem. O que me remeteu aos primórdios, época em que fumava Free e comprava a versão paraguaia, pagando por ela um vale-transporte. Custava metade do preço da original, ou menos. Hoje fumo Carlton, tratei de trazer umas quatro carteiras para a Argentina, afinal não sabia o que as tabacarias de cá me poderiam oferecer.
Sair de Cidade do Leste foi um pandemônio. Afora o trânsito, que assusta mais que o de São Paulo (note-se aqui um exercício de exagero) e que se tornou ainda mais caótico por conta do pé d'água, estacionaram um ônibus de sacoleiros no meio da via no Paseo San Blaz, ocupando duas faixas, para abarrotar o bagageiro com muamba. Emanei sinceras recomendações à mãe do motorista, claro. E, assim, voltei ao Brasil. Uma viagem de poucos metros ao exterior, e que me proporcionou uma sensação rara de estar longe e com saudade do lugar onde vivo.
Buenos Aires, onde estou agora, é mais acolhedora. Em primeira vista, uma Curitiba onde se fala enrolado. O fim de semana de trabalho dá pouca margem a exercícios turísticos, ainda espero cumprir alguns dos inúmeros roteiros que me indicaram.
Mas que não me convidem a cruzar a ponte tão cedo.
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