quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Os caras do meio: Rodrigo Mattar

Vão falar que só dou espaço aos amigos, que não vou a fundo na proposta, e tal. Podem falar, talvez a ideia seja essa, mesmo. Não é pretensão da série vasculhar arqueologias ou desvendar segredos dos grandes papas da área, mas sim apresentar à audiência daqui – que tem crescido, podem acreditar – um pouco dos hábitos e do trabalho de alguns colegas. Hoje, trago meu sparring tuítico Rodrigo Mattar, comentarista do SporTV, de quem vou ganhar uma caixa de cerveja no fim do ano como resultado de uma bem sucedida aposta ambientada no futebol. Ele torce pelo Fluminense de maneira doentia; eu, pelo Corinthians, o que ultimamente também tem me parecido uma doença.

Uma das características do Rodrigo é a memória de elefante. Ao know-how estatístico que é quase enciclopédico, alia o bom conhecimento técnico das categorias com que trabalha. O resultado vem à tona nas transmissões automobilísticas em que atua como comentarista pelo SporTV e em seu blog, o “A mil por hora”. No Twitter, o carioca de Ramos – faz questão de dizer que hoje mora na Tijuca – despacha como @rodrigomattar71, perfil pessoal que criou mais recentemente como alternativa ao @amilporhora – fala de corridas em um, de todo que lhe vem à telha no outro.

Rodrigo Mattar entrou na casa dos “enta”. Nasceu no Rio de Janeiro em 1971, no dia em que sua mãe, completava 33 anos. Acho legais essas coincidências, talvez por fazer parte, eu mesmo, de uma delas – nasci no dia do aniversário do meu pai. Sei que o Rubens Barrichello também faz aniversário junto com o Rubão, e somos todos do mês de maio. Tinha um caso assim, parece que ainda mais excêntrico, na família do José Carlos Pace, o que não vem ao caso. Mattar, com a chegada aos 40, admite estar menos irritadiço. Algo que posso testemunhar – ele me deu essa entrevista sem reclamar nenhuma vez. O mundo tem salvação.

Luc – Você alia o conhecimento de causa a uma ótima memória. Qual é o “truque” para armazenar tantos fatos e números?
Rodrigo – Cara, não sei explicar. Talvez seja o fato de que tenho uma capacidade - sem falsa modéstia nenhuma - de me lembrar de tudo isso. Eventualmente a gente “escorrega” num detalhe, até porque depois dos 40 a memória começa a ser inimiga. E o fato de ter uma memória, digamos, privilegiada, me incomodou porque tinha gente que apelava para as piadinhas. Mas hoje, não mais.

Luc – São quantas corridas por ano na agenda de transmissões?
Rodrigo – Não sei precisar hoje quantas corridas comento por ano. Considere que em 2011 fiz 19 provas da GP2, algumas outras do WTCC e todas do Racing Festival. Então foram mais de 30 corridas neste ano. Mas houve anos, como os da época em que transmitíamos a Nascar, onde fiz disparado mais de 50 transmissões. E já narrei Brasileiro de Marcas, Stock Júnior e WTCC, bem como os programas do FIA GT e da Le Mans Series para o SporTV.

Luc – E como foi que você se meteu nessa roubada chamada jornalismo?
Rodrigo – Rapaz, o começo da carreira foi no Jornal do Brasil, em 1996. Foca da editoria de esportes. Foi o ano do primeiro rebaixamento do Fluminense, então um dos orgulhos – embora todo mundo saiba que eu sou tricolor fanático – foi emplacar uma chamada de capa para uma matéria, evidentemente não assinada, dizendo que o Flu tinha a pior defesa em números absolutos da história do campeonato. Vexame que felizmente o tempo apagou porque depois vieram times muito piores. Aí no início de 1997 cometi a bobagem de sair do JB e ir trabalhar numa assessoria de imprensa que cuidava, entre outras coisas, da Fórmula Indy e da MotoGP aqui. Se por um lado foi bom por poder estar em dois eventos internacionais, por outro foi terrível. O que me motivou a procurar fazer as provas do projeto Estagiar da TV Globo. Na primeira vez não passei e na segunda insisti e me chamaram. Cumpri o período de estágio que era de seis meses, saí e fiquei fazendo uns "frilas" - escrevendo textos para a finada revista Club Motor, para uma revista que foi distribuída no GP do Brasil de 1999 e outra da Fórmula Indy, no mesmo ano.

Luc – Demorou para voltar à Globo?
Rodrigo – Chegou julho de 1999 e o Emanuel Castro, então gerente de eventos da Globo e que depois seria o cara que me levou para o SporTV quatro anos depois, me chamou pra trabalhar com ele. E aí completei 12 anos de casa, porque como o SporTV é da Globo desde 2003, então tenho esse período de vínculo com o meu atual local de trabalho.

Luc – Mas seu trabalho no SporTV não se limita ao automobilismo, certo?
Rodrigo – Entrei em 2003 como editor do falecido Grid Motor e em maio fui aproveitado como comentarista de automobilismo, estreando numa corrida de Stock Car em Jacarepaguá, ganha pelo David Muffato. Mas o raio de ação aqui não se restringe apenas ao automobilismo. Nos plantões sobra de tudo, principalmente futebol. Faz parte. Na Globo eu ajudava nas transmissões de Fórmula 1 e nos demais eventos onde achavam necessária minha presença. Fui da equipe de produção em todos os GPs do Brasil de Motovelocidade a partir de 1999. Até coordenei no "switcher" o GP da Austrália de Motovelocidade em 2002, quando o Barros foi segundo colocado atrás do Valentino Rossi.

Luc – Seu trabalho (e também o lazer, por que não?) tem uma identificação muito grande com as provas de Endurance. Como isso começou?
Rodrigo – O fascínio pelos protótipos começou com os antigos exemplares de Quatro Rodas e Auto Esporte com que meu pai me “presenteava”. Comprei também várias revistas em sebos. E passei a estudar um pouco mais a história dessa modalidade, que sempre teve forte presença de pilotos da Fórmula 1. Com a dita “globalização”, vieram as redes sociais, os amigos igualmente fanáticos e aí estourou. Pode parecer brincadeira, mas não é: em 2009 acompanhei as 24 Horas de Le Mans inteiras, pela internet, madrugada adentro. Francamente, não sei como consegui isso. Hoje, posso considerar que tenho um bom conhecimento da modalidade, mas não à altura dos meus colegas jornalistas europeus e norte-americanos, que têm uma proximidade muito maior com a Endurance. É uma pena que a nossa principal prova, as Mil Milhas, esteja paralisada e sem rumo. Quem viu aquele espetáculo que foi a prova de 2007, com Peugeot, Creation, Spyker, Corvette, Aston Martin, Zytek, Porsche e outros, não esquece jamais.

Luc – Você tem parâmetros suficientes para comparar o automobilismo do Brasil com o lá de fora...
Rodrigo – É complicado falar disso. O Brasil é um manancial de talentos imenso para o automobilismo, sempre foi, mas corremos o risco de uma entressafra violenta no futuro. Não sou eu quem diz isso. Os fatos mostram. Cada vez menos pilotos do país vão para a Europa e os Estados Unidos, diferente do "boom" verificado nos anos 80/90. Sem talentos, não há renovação e sem renovação, não há ídolos. Com os europeus, acho que ainda temos o que aprender em três pontos: profissionalismo, variedade de categorias e principalmente respeito ao público.

Luc – Você também trabalha também com futebol e outras modalidades. Isso tem influência em sua especialização no automobilismo?
Rodrigo – Não compromete e nem ajuda. Acho que agrega para a gente ter uma visão mais ampla em relação a outros esportes, mostrar conhecimento quando necessário e formar opiniões.

Luc – Você não faz muita questão de ser “politicamente correto” em seu contato com seu público via redes sociais. É proposital?
Rodrigo – Você já deve ter notado que eu parei de polemizar. Se não notou, provavelmente perceberá isso. Digamos que eu tenha sido aconselhado a pegar mais leve e esquecer algumas coisas. Farei isso para o meu bem e para que os meus contatos no twitter, por exemplo, busquem informação e não se espantem com críticas ácidas que podem afastá-los de lá.

Luc – Em se tratando de narradores e comentaristas de automobilismo, as emissoras do Brasil estão bem servidas?
Rodrigo – Tem um tal de Luc Monteiro, que é muito, mas muito ruim! Brincadeira, viu... você sabe que não penso isso a seu respeito. Acho que temos menos narradores e comentaristas especializados em esportes a motor do que mereceríamos ter. Não vou apontar destaques positivos ou negativos para ninguém se sentir melindrado. Nem eu me acho bom o suficiente para ser incluído em qualquer tipo de lista!

Luc – O automobilismo é uma especialização que você recomenda a quem está chegando ao jornalismo?
Rodrigo – Precisamos de renovação. Renovação no jornalismo esportivo motorizado é bem-vinda. Aliás, temos gente abaixo dos 40 anos de idade que é muito competente, mas ninguém fica pra semente. Em 10 anos eu terei 50, muitos outros terão 40 e a molecada tem que surgir para nos substituir. É um processo que faz parte.

Luc – Acompanhando corridas, futebol, carnaval, cinema, games, o escambau, e dominando esses assuntos todos, você encontra tempo pra comer e dormir?
Rodrigo – Nessa vida a gente tem que encontrar tempo pra tudo. Consigo comer sim, embora ache que me alimente muito mal. E dormir também. Durmo pouco, entre 5 e 7 horas. Mas normalmente, durmo bem.

Luc – Quais são os pontos fortes e fracos do jornalista/comentarista Rodrigo Mattar?
Rodrigo – Ih! Posso pular essa parte? Não gosto de falar de mim não. Digamos que sigo em constante aprendizado. Está bom assim?

Luc – Qual é o projeto profissional que ainda não foi realizado?
Rodrigo – Cara, tem tanta coisa que eu gostaria de fazer, mas não sei o que acontece que não consigo dar continuidade. Tenho umas coisas escritas sobre a Fórmula Super Vê, uma introdução de um pretenso livro sobre a história da categoria, que naturalmente desembocaria na Fórmula 2 Brasil e na F-3 sul-americana. Mas falta tempo, material de pesquisa e eu mesmo não me sinto tão motivado a fazer um projeto desta magnitude sozinho. Outra vontade que tenho é ir assistir ao vivo e a cores as 12 Horas de Sebring, as 24 Horas de Le Mans e a Petit Le Mans, além das 500 Milhas de Indianápolis e o GP de Mônaco. Mas por enquanto não passam de sonhos. E eu não tenho dinheiro para bancar do próprio bolso uma viagem tão dispendiosa.

Mattar com Jacques Laffite, no GP do Brasil em 2008, e de carona com Ricardo Maurício no Porsche Cup

2 comentários:

@FabinhoMoura, via Twitter, disse...

Muito boa a entrevista do @lucmonteiro com o @rodrigomattar71 , parabens aos dois, um pela entrevista e o outro pelas otimas respostas!

Andre Duek disse...

O Rodrigo é uma referência para mim nesta seara de comentarista,pois é um cara técnico,preciso e comenta as corridas sem rodeios ou puxação de sardinha!
Luc,parabéns pela entrevista!
Abs