terça-feira, 23 de março de 2010

Sim, nós temos autódromo. Temos?

Autódromo de Cascavel lotado em evento da F-Truck: imagem do passado

Devo ter um carimbo moral na testa que indica “o cara do autódromo”.

Quando viajo para trabalhar com locução ou prestar serviços jornalísticos nas corridas em outros lugares, sempre há uma penca de colegas e até de desconhecidos que perguntam sobre o autódromo de Cascavel. Aqui na cidade não é muito diferente. No boteco da Iraci, no estacionamento, no aviário do Mirto ou no quiosque de espetinhos do posto, sempre alguém recorre a mim para saber qual será o destino da nossa pista de corridas. O pronome "nossa", neste caso, revela apenas uma conotação geográfica, a pista não é de ninguém que não seus donos.

Lá fora, é compreensível o interesse de entendidos em automobilismo no futuro – negro, diga-se – da nossa praça. A infraestrutura do autódromo de Cascavel é sofrível, rivaliza com os de Fortaleza e Caruaru a condição de pior. A pista, propriamente dita, é a melhor das 14, qualquer um que já pisou por aqui, ou que já acelerou, pode atestar.

Principalmente pelas bandas de cá, são latentes as críticas ao prefeito, a qualquer um que seja prefeito em qualquer época, pela falta de investimento no autódromo. O automobilismo movimenta a economia, gera retorno, aquele papo de sempre. Ah, e mais importante de tudo, Cascavel tem tradição. Por que o prefeito não investe?, perguntam, como que tentando fazerem crer que os cofres públicos estão jorrando dinheiro para algo que vai atender, mais indireta do que diretamente, uma parcela pequena da população.

Em primeiro lugar, o autódromo é propriedade particular, não cabe ao Município investir nada ali. Indo além, dinheiro público para aplicação no esporte tem de ser canalizado a competições de base, formação de atletas, até recreação. Prefeitura nenhuma tem de patrocinar nada, já acho fora de propósito – e me criticam por isso – bancar parte dos times da cidade em competições de rendimento. Aplaudo quando constato iniciativas concretas que oportunizam a prática esportiva à molecada dos bairros, isso sim é papel de um governo eleito.

Ainda que não se assuma, a área de quase 40 alqueires onde está instalado o autódromo, cuja maior parte é protegida pelas leis de preservação ambiental, é motivo de uma especulação imobiliária intensa. A ideia que encontra um pai a cada esquina é a de se dividir a faixa frontal da área, localizada em área industrial e marginando a principal rodovia da região, em coisa de 18 ou 20 terrenos, com frente de 50 metros e fundo de 60 ou 70. Uma solução que contempla a preservação de duas vias de acesso ao autódromo.

Cada terreno desse, juram os ditos entendidos, valeria meio milhão de reais. O suficiente para um faturamento aproximado de R$ 10 milhões, bem mais que o dobro – mais que o triplo, talvez – da quantia pela qual os donos do autódromo, que não escondem a mágoa por não lucrarem nada com a propriedade, topariam vendê-lo a qualquer mortal que apresentasse o dinheiro em assembleia.

É aí que reside o xis da questão. Os donos do autódromo não ganham nada com sua posse. E nem vão ganhar. Autódromo, para dar dinheiro, tem de funcionar. Para funcionar, tem de oferecer o que é necessário à realização de bons eventos, que trazem gente de todos os cantos à cidade, que lotam hoteis, que geram movimento nos postos de combustíveis, nos restaurantes, nos bares e, lógico, nas casas noturnas de entretenimento masculino.

Algum dos dezenas de donos do autódromo de Cascavel – ninguém sabe precisar quantos são – vai investir sob essa linha de raciocínio? Sem chance. E a prefeitura? Menos ainda, mesmo que se retomem os esforços para que todas as cotas sejam doadas ao Município.

Fosse eu um sujeito de visão e de boa conta bancária, compraria o autódromo, promoveria todos os estudos de viabilidade necessários, investiria nas reformas necessárias e faria com que o local me devolvesse os caraminguás investidos. Não tenho dinheiro, muito menos visão empresarial para uma empreitada tão ousada.

É fácil entender o que alego. Há exemplos concretos, inclusive. O autódromo de Curitiba, até 1994, era ainda pior que o de Cascavel. Ficou fechado por um ano e meio, foi completamente remodelado pelo consórcio que o arrendou e, em que pesem os antigos quiproquós trabalhistas que podem pô-lo em leilão, disputa com o de Interlagos a condição de melhor do Brasil.

Concordo que Cascavel mereça mais, mas realidade só há uma. Gostaria de ver por aqui um autódromo com estrutura condizente com os padrões atuais do automobilismo que vejo praticamente todos os fins de semana em alguma pista de corridas do Brasil. Sei que há gente de CEP bem distante que considera, ainda que timidamente, a formulação de uma proposta para compra do local. Em termos práticos, é a única chance do autódromo ressuscitar e suplantar o pensamento provinciano que reina por aqui.

Quanto à tradição cascavelense no automobilismo, para que seja reconhecida em níveis viáveis, que se produza um bom livro a respeito. Eu compro um exemplar, se vier autografado.




Prova da Divisão 4 em Cascavel, ainda nos anos 70: na infraestrutura do autódromo, pouca coisa mudou de lá para cá

7 comentários:

Cascavevelense(amante automobilistico) disse...

Belo texto Luc, é dificil entender o porque de tanto lenga-lenga, está parecendo uma novela, esperamos que tanha um final feliz para todos cascavelenses e por que não dizer para o oeste paranaense?

Anônimo disse...

Já perdemos a formula-truck, daqui uns dia nem racha de moto mais teremos! lamentavel

Marcelo Beux disse...

Como filho de socio e tbem construtor do autodromo e tbem entendo que seja dificil uma solucao boa e breve, porem ouvimos e lemos q muitas pessoas so sabem falar mal do autodromo que temos !!Se essas pessoas sao tao superiores assim pque nao compram o autodromo ou um terreno e constroem outro ?? facil nao ??

LUC disse...

Não vejo a constatação da deficiência da infraestrutura do autódromo, fruto da estagnação diante de décadas marcadas pelo advento de várias novas pistas, como crítica, Marcelo. A meu ver, tentou-se tudo que era possível para que a situação fosse resolvida por aqui, a presença do Miguel (é seu parente?) na presidência do ACC tinha tudo para ser o marco definitivo. Ele, infelizmente, não conseguiu pôr em prática tudo que tem em mente, parece-me que já está aborrecido com os rumos que a situação tomou.

Grande abraço, grato pelo comentário.

Anônimo disse...

Sim, somos primos e sei que ele esta tentando fazer o melhor possivel !!! Me refiro a comentarios de pessoas em dias de racha, nos postos, nas rodinhas por ai... Claro que eu tbem qro melhorias, mas que entendam que nao e tao simples assim e por isso sugiro que os criticos tentem encarar p sentir q nao e tao facil. Obrigado pelo espaço (Ja dei entrevista no Jorge Guirado a anos atras pedindo um acordo com alguma petrolifera !! Oque ele mesmo achou muito boa ideia, mas........)

Marcelo Beux disse...

Desculpe ter saido como anonimo acima, sou eu mesmo Marcelo Beux

LUC disse...

Espaço aberto sempre que quiser, Marcelo. Aliás, ouvir a família Beux a respeito é no mínimo questão de respeito à história - embora, como disse no post de ontem, a história mereça bom registro, mas não garante conquistas.